Marcelo Coelho
Não dá para postar na íntegra “Assinatura”, o belo poema que leio em Pedra de Luz, de Rodrigo Petronio, (editora A Girafa), mas as estrofes que reproduzo abaixo já são suficientes, acho, para dar idéia da grande imaginação poética do autor, nascido em 1975.
Ele não tem medo dos poemas longos, das palavras “nobres”, como “amaranto”, “vinhas”, “alfombra”, “safira”, nem dos versos que são bonitos, bonitos sozinhos, sonoramente, e antiquadamente, como
Âmbar diáfano que teu coração irriga
(“Música natural”)
ou
Em algumas carícias breves abatida
(“Estampas de Minas)
Rodrigo Petrônio também não procura esconder as influências variadas (Rilke, Augusto dos Anjos, Dora Ferreira da Silva, Augusto Frederico Schmidt) que retornam com freqüência aos seus poemas, e que muitas vezes são o ponto de partida para um diálogo explícito com algumas obras que lhe servem de inspiração. Assim, “Memórias de um Século” começa com uma menção a Apollinaire:
Está cansado desse mundo antigo (...)?
E o fantasma de Drummond é invocado repetidamente, por exemplo em “Quetzalcoátl” (“Sou apenas um homem americano...”), em “Sobre a folha de água corrente” (“Quem se lembra de dinamitar Manhattan?”), assim como em “Assinatura” (a lua “diurética”). Mas vamos às estrofes de “Assinatura”.
Olho no céu essa lua
Essa esférica bacia
Que molha todo esse mundo
Com sua prata derretida
Olho no céu essa lua
O que é que nela palpita?
Seria o sonho dos vivos
Que pra ela à noite migra?
Olho no céu essa lua
Poética e radioativa
A mesma que sobre Herodes
Pousou suas asas de brisa
Olho no céu essa lua
Que esparge sua bênção fria
Sobre todas as criaturas
Cospe sua ração líqüida
...
Olho no céu essa lua
Que ilumina São João
Com a cabeça separada
Do corpo em putrefação
...
Olho no céu essa lua
Esse disco de algodão
Que o discóbolo lançou
Há dois mil anos do chão
...
Olho no céu essa lua
Em seu alcoólico elixir
Seus mil dedos de anêmona
Afagam o que está por vir
...
Olho no céu essa lua
Não é aérea ou mineral
Sua compleição feminina
Sua coloração de hospital
Olho no céu essa lua
Canteiro de turmalina
Despeja luz sobre tudo
Com tinta branca se assina
No livro mudo do mundo.
Leia:
http://marcelocoelho.folha.blog.uol.com.br/arch2008-01-01_2008-01-31.html