segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Pedra de Luz de Rodrigo Petronio: em busca da poesia total - Claudio Willer


Depois de um ensaio como o de Mário Dirienzo – Corpo como razão: a poesia de Rodrigo Petronio (disponível em Agulha, www.secrel.com.br/jpoesia/ag50petronio.htm) – com um mapeamento tão minucioso e preciso do recente Pedra de Luz (A Girafa, São Paulo, 2005), resta apenas fazer o registro mais subjetivo dessa obra.
Através de um exercício de abstração, faço de conta que não conheço o autor, que Rodrigo Petronio não é meu interlocutor regular. Procuro imaginá-lo ou visualizá-lo, a esse hipotético desconhecido, através da leitura do seu livro de poesia. Assim praticando o mais puro impressionismo em crítica, diria que Pedra de Luz espanta. Isso, não só por sua dimensão, mas pela amplidão, pelo que tenta abarcar. A impressão que me provocaria, se fosse possível essa separação total de autor conhecido e poesia lida, é que Pedra de Luz foi escrito por alguém que já viu tudo. Viu e, acrescente-se, viveu. E que já leu de tudo, também. Ou, ao menos, do que importa. Devorador de poesia, dialoga, em sua leitura ativa e participativa, com os clássicos, inclusive Camões, a Bíblia, com Baudelaire e Rimbaud, e com os modernos e contemporâneos, como Apollinaire, Octavio Paz (o título, Pedra de Luz, é alusão à Pedra de Sol do mexicano), Drummond, Herberto Helder (inclusive em epígrafes), Roberto Piva, e tantos outros. Daí resultar um livro de poesia dessas dimensões, e dessa amplidão temática e formal, dos metros mais tradicionais e do soneto à mais contemporânea prosa poética; da linguagem direta ao hermetismo.
É como se a sua feitura fosse impulsionada por uma ambição desmedida de realizar a poesia total, a impossível síntese do simbólico e do real. O livro todo é animado por uma tensão entre dois mundos: um deles, atual, prosaico; outro, mítico, arcaico ou atemporal. Há um trânsito entre um e outro, no conjunto de poemas que compõem Pedra de Luz. Daí a variedade de referências geográficas: o poeta vai de Heliopolis ao metrô paulistano, passando pela Costa do Marfim.O caráter pletórico de Pedra de Luz, com sua variedade e diversidade, mostra Rodrigo Petronio como um selvagem refinado, um bárbaro erudito impelido por uma sensação de urgência de, ao mesmo tempo, querer destruir e refazer o mundo: Uso as mesmas palavras para batizar um mundo novo:/ Pão, cinzel, ouro, fala, sol, fome, selva./ E eis que elas circulam por minhas artérias:/ Sexo, sede, fruto, pomo. Essa recriação tem que ser feita pela via da transgressão: Rouba, saca, esquarteja, plagia/ Furta, copia, inventa, cria, corta [...] Isso é poesia – o resto é arte, proclama de modo veemente.
Pensando bem, esse ímpeto destrutivo e simultaneamente de reconstrução ou recriação não é coisa de autor ‘maduro’, do hipotético erudito já de certa idade que poderia visualizar através dos poemas, alguém que leu de tudo e já viu tudo, porém de um adolescente. É o juvenil levado a extremos. Mas talvez o talento poético resida nisso, na capacidade de preservar a rebelião e o lirismo mais juvenil para chegar a sínteses como esta: Tens a lâmpada, a migração das aves, o ruído das veias, a seiva dos animais e a alvura do cisne. Em outras palavras, tudo.